Discurso proferido em 14 de Agosto de um dos terraços do convento da Batalha, por
ocasião da peregrinação nacional ao histórico monumento. Invocação de Aljubarrota
como a verdadeira festa da independência da Pátria:
Estamos no convento piedosamente erigido em comemoração da batalha, e assim
chamado por esse motivo, rente à igreja onde gerações de crentes se revezam em
oração, a dois passos da capela do fundador onde repousam D. João I, D. Filipa de
Lencastre, os filhos (como se o carinho dos pais e a devoção filial mesmo na terra
sobrevivessem à morte) – família heróica, «ínclita geração», toda sacrificada ao
serviço da Pátria no estudo, nas guerras, nas descobertas e conquistas, na governação;
e muito perto, na sala do Capítulo, não sei quem, filho do povo decerto, em pleno
direito admitido destacadamente à convivência real do mosteiro, representa os
desconhecidos esforços, as contribuições anónimas sobre que assentam as vitórias e a
tantos séculos de distância o mesmo sacrifício da vida pela mesma causa da Pátria.
Não sei que tenhamos em Portugal ambiente de maior espiritualidade, onde a nossa
alma mais penetrada se sinta de elevados sentimentos: Deus, a Pátria, a Família, o
dever, o sacrifício; o desinteresse , a paz dos mortos têm aqui representações ou
projecções sensíveis, tocantes, sem que ao mesmo tempo deixe de respirar-se o ar
alvoroçado das vitórias.
Nós somos filhos e agentes de uma civilização milenária que tem vindo a elevar e
converter os povos a concepção superior da própria vida, a fazer homens pelo domínio
do espírito sobre a matéria, pelo domínio da razão sobre os instintos. Eu não desejaria
por isso que nesta romagem, para exaltação do sentimento da independência nacional,
deixassem de ser considerados aqueloutros elementos humanos e sobre humanos com
os quais podem e devem coexistir as Pátrias, e em cujo ambiente e defesa há-de
florescer o nosso nacionalismo. São lutas de civilização – tantos cegos o não vêem! –
são lutas de civilização aquelas a que assistimos, e é verdade que entra pelos olhos
estar a medir-se hoje a vitalidade dos povos pela soma de energias trazidas a este
gigantesco debate.
A nossa causa nem se nos pode perguntar qual seja – ela resulta da história e da nossa
formação moral; a parte que nela tomam os portugueses há-de aferir-se pelo inteiro
sacrifício da vida e da fortuna pelo que para nós excede em valor a fortuna e a vida.
Viestes de todos os cantos do País e representais Portugal inteiro. Escutai. Paira sobre
nós o espírito heróico de Nun’Álvares; parecem mesmo ouvir-se vozes de comando, o
retinir das armas, estrondos da batalha: «ainda não», responderia calmo. Mas, quando
preciso, à chamada que vos seja feita para lutardes sob a sua bandeira, não deixará um
só de vós – sei-o bem – de responder: presente!
(Discursos, volume 2º , pág. 177, 178 e 179).
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